Democrata: o sonho não acabou

O carro nunca chegou a ser comercializado oficialmente pela IBAP, mas as carrocerias existem e fazem parte da história automotiva brasileira

Já faz 25 anos desde que eu e meu irmão, José Luiz, adquirimos a massa falida da IBAP – Indústria Brasileira de Automóveis Presidente, do visionário empreendedor Nélson Fernandes, que em 1965 foi processada por fraude e decretou falência em 1968, antes mesmo de produzir o veículo que tinha em mente: o Democrata.

  • Um dos cinco protótipos montados para servir de modelo em publicidade e eventos
  • As carrocerias estão guardadas à espera de restauração
  • Peças do Democrata ainda sem uso
  • Protótipo do sedan de quatro portas, bem diferente do 2 portas
  • Mesmo depois de muito tempo, resistência estrutural é grande
  • O interior era elegante, com painel de madeira, e conta-giros
  • Foto de época da linha de produção da IBAP

O tempo provou que Fernandes não era criminoso, mas já era tarde. Para ele, o sonho de fazer o primeiro carro com projeto 100% nacional havia acabado. Entre 1963, ano que iniciou o projeto, a 1968 foram feitos cinco protótipos, dos quais apenas três ainda existem. Porém, isso não é tudo.

A massa falida da IBAP é muito rica, ao ponto de ainda ser possível dar continuidade ao sonho de Fernandes. Não será mais o primeiro carro com projeto 100% nacional, mas é parte da história automotiva brasileira que nunca aconteceu e merece virar realidade.

Ainda existem algumas carcaças do Democrata, que por ser de fibra de vidro não demanda cuidados especiais como o metal para evitar corrosão. Foram feitos para durar muito tempo.

O projeto era todo da IBAP, com exceção do motor, um V6 (com ângulo de 60°) 2.5 com bloco em alumínio que desenvolvia 120 cv a 4500 rpm. Foi desenvolvido exclusivamente para o Democrata pela italiana Procosautom (Proggetazione Costruzione Auto Motori).

Restaurar as carrocerias abandonadas é tarefa hércula, mas não é impossível. Temos planos, sim, para elas, ainda que distantes. Não achamos justo haver apenas um unidade em museu (no Museu do Automóvel de Brasília) para exposição ao público, afinal existe a oportunidade de haver mais unidades em outros museus, outras exposições.

O Presidente Democrata simboliza o potencial da engenharia brasileira no setor automotivo. Um direito do brasileiro que foi caçado durante a ditadura militar, assim como inúmeros outros, sempre com uma desculpa esfarrapada criada por quem não admitia, na época, perder a posição de destaque que ocupava no mercado.

Outro grande brasileiro que também tentou e foi podado, anos mais tarde, foi Amaral Gurgel. Este, pelo menos, conseguiu lançar os produtos no mercado. Imaginem se ambas iniciativas tivessem tido o apoio que mereciam? Talvez a situação do mercado automotivo hoje seria totalmente diferente. Ao invés de nos maravilhar com subprodutos globais, estaríamos exportando tecnologia de ponta.

Colocar a culpa pura e simplesmente no governo da época é contar apenas parte da história. Muitos duvidaram de Fernandes, inclusive a imprensa especializada da época. Claro, o plano de negócio era muito ousado para os anos 1960, assim como o veículo que era proposto.

O Democrata era um projeto bem avançado para a época. O design fluido e elegante não tinha igual na indústria automotiva brasileira da época. Somente nos anos 2000 surgiu a expressão design fluido. O uso de fibra de vidro na carroceria era novidade, assim como os bancos dianteiros individuais e reclináveis com um console entre eles. Além disso, contava com uma direção macia e precisa, por conta do tamanho do volante e baixo peso na dianteira.

Pensem em como o mercado teria evoluído diferente com o Democrata nas ruas. E este era apenas o começo, pois Fernandes tinha planos para um carro popular também, com motor de 300 a 500 cm³.

Ficha técnica
IBAP Democrata
Motor: traseiro, longitudinal, V6, 2.527cm3, duplo comando de válvulas no cabeçote, bloco de alumínio fundido, 120 cv a 4.500 rpm, diâmetro x curso: 84 x 76 mm, 8,2:1
Câmbio: manual de 4 velocidades
Direção: mecânica, sem assistência
Tração: traseira
Suspensão: independente na dianteira com braços triangulares superiores, braços de força inferiores, molas helicoidais, amortecedores hidráulicos de dupla ação, e traseira com semi-eixos oscilantes, braços longitudinais, molas helicoidais, amortecedores hidráulicos de dupla ação
Freios: tambor nas quatro rodas
Rodas e pneus: aço, 7,35 – 15
Dimensões: comprimento, 4.680 mm, largura, 1.720mm, altura, 1.390mm, peso, 1.150 kg
Desempenho: velocidade máxima, 170km/haceleração 0 a 100 km/h: 10 s